quarta-feira, 12 de maio de 2010

vocês não entendem - parte 2 ou eu não sou a luciana

eu falei que iria escrever um pouco mais sobre o meu dia a dia e não vou decepcioná-los. no primeiro texto eu falei sobre xixi e cocô. não vou falar sobre ereção. esse blog é lido por menores de idade e isso seria pornográfico. eu até posso ser desbocado, mas não sou pornográfico.

como muitos de vocês viram, eu estou com aparelhos novos, sendo que um deles me permite ficar de pé quase sem ajuda. é uma sensação estranha, ficar de pé, dez meses depois. eu não lembrava que eu era tão alto - e eu sempre me achava baixinho (talvez por que sempre me interessei por mulheres mais altas do que eu (com uma exceção muito importante e especial)). eu não posso usar aquele treco sozinho. preciso de ajuda para colocá-lo, para subir e para me manter de pé, mas mal parodiando neil armstrong: é um pequeno passo para mim, mas um grande passo para a a minha recuperação.

aí, agora, me pego pensando, como é possível que de um dia para o outro eu possa ter uma atitude totalmente diferente em relação à vida, a minha recuperação, às pessoas ao meu redor, além de acreditar no inimaginável e sentir na carne - e nos ossos - essa diferença? realmente existem mais segredos e coisas inexplicáveis entre o ceu e a terra do que a gente imagina. que bom!

porque eu coloquei no título que eu não sou a luciana? um motivo muito simples: a tv monta todo um glamour em torno da personagem, sem contar que ela tem tudo o que é de mais moderno e avançado, profissionais o tempo inteiro ao redor dela, e outras coisas que não cabem colocar aqui. isso é televisão! é ridículo. é tudo fake. no máximo a minha história se parece com a de algumas das pessoas que se prestam a dar aqueles depoimentos cheios de emoção no final de cada capítulo da novela. tudo o que se fala ali (dos poucos capítulos que vi) é um quadro bonito de uma situação de merda que aflige muita gente, inclusive eu.

não é bom ser para ou tetraplégico. não é bom acordar de manhã e ver que tu não consegues caminhar. não é nada bom tomar consciência de que isso pode ser permanente. não é bom sentir dor diariamente, desde o momento em que tu acordas até o momento em que adormeces (com ajuda de remédios fortíssimos). e, sobretudo, não é bom olhar para o lado e ver que tu precisas de um equipamento estranho chamado cadeira de rodas para se locomover. é uma merda. não venham me dizer que é bom ou que é aceitável. não. não é aceitável, isso não faz parte da condição natural humana. pessoas normais caminham, fazem xixi, cocô e sexo normalmente e não com a ajuda de remédios ou sem consciência. quem diz que isso é bom é hipócrita. e quem acredita nisso é tão ingênuo quanto o cândido de voltaire, que vê o mundo desmoronar ao ser redor, mas sempre acha que tudo está o melhor possível.

ter consciência disso não me faz perder a vontade de continuar lutando e trabalhando para melhorar, não vai me fazer esmorecer. eu quero recuperar tudo de volta. e vou fazer de tudo para ter tudo de volta. em alguns dias eu posso me permitir ficar mal, depressivo, chato, querendo morrer. mas faz parte. c'est la vie, e, reiterando, eu não sou a luciana.